quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Hoje estive num workshpo de escrita criativa organizado pela Raíz Editora, no Museu Nacional de Arte Antiga.
Começou pedindo  que cada participante desenhasse um objeto que representasse cada letra do seu nome.
O meu ficou assim:
J=chuveiro
U= copo
L= canto de um quadro
I=lápis
A=Um cara sorrindo com um chapéu triangular

E o texto foi este:

Ouvi um som estranho.Não sabia bem de onde vinha.Ping!Ping!Ping!Escutei ,de novo.Atentamente.Vinha dali do lado da casa de banho.O chuveiro pingava para um copo vazio.Como teria ele ido parar à banheira?
Talvez tivesse sido eu que o esqueci lpara regar as flores.Quando enchesse. Certamente,não seriam as da Natureza Morta que olhavam de cima para o sofá da sala.Gostava tanto daquela imagem que desejei criar outra semelhante.Mas viva.Era o vaso que tinha na varanda do meu quarto.E da janela ,pegando num lápis
esboçava a minha cidade.Lisboa.E sorria...



segunda-feira, 9 de julho de 2012


REPENSANDO



A Águia da Associação Cultural de Aviz  publicou.Obrigada!Um profundo agradecimento ao amigo Fernando Máximo!



Sofia pegou numa rosa com amor.Tinha-lhe sido oferecida por António seu companheiro de vida com quem tinha partilhado trabalho,sorrisos e alguns abraços.Não tinha conseguido partilhar o seu enorme amor.Ele não reparava nela como mulher.Pensava.
Era ,apenas,a sua grande amiga.Quando  lhe veio oferecer um ramo de flores por gratidão,ela sufocou o soluço que lhe rebentava no peito.Aconchegou-o bem perto do coração.Que batia forte.Apressado.Ainda.No fim de tantos anos.Tirou uma flor e olhou-a pensativa.Foi quando descobriu uma lágrima numa das pétalas.Grande.Quase a cair.Ir-se ia desfazer .Juntar à terra que pisava.Então, ouviu uma voz que lhe sussurrou:

-Eu não sou choro como pensas.Sou vida.Sou alegria.Sou água.Sou orvalho.
-És frio...
-Não!Sou transparente.Tantas vezes brilhante quando o Sol da manhã me bate
-Ou gelas...Queimas e matas.
-Para que depois as plantas cresçam mais fortes,mais verdejantes.Eu surjo de madrugada.Anuncio o dia.


A noite estava calda a ouvir.A Lua tinha nascido alaranjada por reflexo e crescia na brancura de Janeiro.Iluminava o céu com a doçura dos namorados.A noite bem sabia que dava novos tons à Natureza.Que as estrelas eram pontos de luz onde em sonhos habitava cada homem.Era o tempo de descanso dos corpos e das almas.Era,tantas vezes,um manto sobre a fealdade.Por tudo isto resolveu falar:

-Sofia,estás-me a ouvir?Deixa cair a flor da tua mão.Não a tentes segurar.Vai secar.
-Não,não!Foi o António que me deu!
-Eu sei,minha querida!Ela pode servir para descobrires a diferença.
-Que diferença?
-Dos amantes.
Diferenças...Igualdade...
-Igualdade?
Sim!Como o orvalho se evaporou ao calor da manhã também a noite perdeu a sua luz quando o luar se apagou.


O silêncio caiu pesado sobre Sofia.Que sentiria António por ela?Teriam ambos perdido uma vida e um amor?
E tudo aconteceu porque Sofia pegou numa rosa.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

A TRAÇOS LARGOS

2011-2012.A crise.Que futuro?
A  traços largos aconteceu assim.Uma História ao jeito de conto em que as personagens somos todos nós .E cada um.
Remontemos,pois,ao milénio anterior.Ouvindo falar tão repetidamente em milhões,um milhar e uns tantos torna-se pouco.Uma ninharia... mesmo tratando-se de tempo.
Analisemos,então,o Território Portucalense que Condado é termo genérico.Vejamos que a ambição de reconstruir os Estados Ibéricos,herdados por Afonso VI de Leão de seu pai Fernando Magno,perante a investida dos Almorávidas,o fez entregar a defesa da Linha do Tejo a Henrique de Borgonha.
Crise de unidade,
Afonso Henriques,jovem cavaleiro de catorze anos,insurgiu-se contra a mãe e Fernão Peres de Trava,poderoso nobre galego,decidido a anexar o território,
Crise de soberania.
Talvez tivessem sido suficientes estes confrontos para a formação de um país pequeno como Portugal..Faixa rectangular banhada pelas águas azuis do Atlântico.O clima é ameno mas a alma da Nobreza victoriosa apelou à conquista de terras a ao saque.Pela 1ª dinastia passou o "Milagre das Rosas",lembrando a fome que o povo sentia.Que fome é falta de pão para o corpo e para o espírito.Foi,também, escrita uma tão bela quanto triste página de amor:a de Pedro e Inês.E fechando o ciclo a Monarquia hereditária sobe ao trono D. Fernando.Morre de peste.
Crise de sucessão.Crise de Independência.
Entramos,assim, na Idade Moderna.periodo áureo do qual todos nos orgulhamos.Foi o contributo civilizacional, inter e intra cultural que oferecemos ao mundo.Mas enquanto as nossas caravelas sulcavam mares desconhecidos faltavam braços para trabalhar a terra."Oh mar salgado quanto do teu sal são lágrimas de Portugal" escreveu Fernando Pessoa.A rota cumpriu-se.O mercado também.
Aconteceu uma crise de investimento.
D.Sebastião demasiado jovem para ouvir a leitura de "Os Lusíadas"na romântica paisagem de Sintra,enriqueceu-se de sonhos imponderados. Legou-nos a lenda do "Encoberto" ou "Desaparecido".Pesada herança.Do nevoeiro,surgiria ,sem esforço,outra página escrita de memórias gloriosas.
Crise da saudade.
Foi preciso encontrar uma solução.A saudade é retrospectiva.Resolvemos voltar ao mar rumo ao abandonado Brasil.A riqueza voltou,também no tráfego de escravos,açúcar,ouro ,tabaco.Construiram-se monumentos ornamentados de talha dourada.Séculos ,depois, José Saramago escreveria o "Memorial do Convento".
A História é ciclicamente convulsa.Culpou-se a Monarquia dos ataques externos.A Casa Real tinha os dias contados.Deu-se o Regicídio.
Crise de regime.
A 1ª República começou de forma atribulada, instável.Oliveira Salazar foi convidado para Ministro das Finanças.Tendo o próprio saído de uma grave "crise amorosa"dedicou-se ao serviço público de mente e coração.Preencheu quarenta anos de um regime ditatorial e colonialista.A Guerra do Ultramar esgotou os portugueses.Salazar "caiu da cadeira".Marcelo Caetano,apesar de conversar em família não estancou o recrutamento de tropas.
Crise de ditadura.
O golpe de Estado chamado Revolução dos Cravos deu-se a 25 de Abril.Foi grande a expectativa.A esperança.Os presos políticos foram libertados.Acreditou-se na democracia.Ao nascer na Grécia Antiga foi constituída exclusivamente por cidadão.Contágio?
Instalou-se a confusão.Os governos sucederam-se.A união Europeia criou contornos de utopia.O euro tornou-se a moeda única dos seus estados membros.Os mercados destabilizaram.O desemprego instalou-se de forma crescente na sociedade.Tornou-se insistente a palavra austeridade.Soa a desgraça.A economia não adivinha crescimento.A pobreza alastra perante a dura indiferença do poder.
Estamos em 2012.Atravessamos uma crise grave e informe. Que futuro?


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Singela homenagem ao fado

O barco navegava rumo ao Atlântico.
Não era um navio qualquer.Igual ou maior que todos os outros.Era uma embarcação fantasma.O casco era verde de podridão,as velas farrapos e os tripulantes esqueletos.Com alma.Ouvia-se um cantar baixinho...
Tinham deixado a costa de Portugal há cerca de um mês.Sentiam-se perdidos na imensidão da água.Azul.Tantas vezes batida pelo vento que varria o convés de ponta a ponta.As noites eram tenebrosas.Muitas.Ouvir o bater do casco nas ondas e contra elas era muito mais que um risco de vida.Uma oferta.
Queriam alcançar o Brasil,terra lendária,fonte de riquezas várias.
Açucar ,ouro,tabaco...Ponto de triângulo de escravatura.Onde ,na margem de um rio, um português tinha gritado e afirmado a liberdade.A Independência.
A ousadia estava debruçada sobre o mar.Sentiu baterem-lhe nas costas.Ela era um ser diferente entre tantos   outros  seres iguais.Aparentemente iguais,entre si.Era a aventura que a chamava.Esta tinha a forma de uma galáxia brilhante.Rolava de proa a popa.Sentaram-se para conversar já que o tempo era de calmaria.
-Como te sentes?
-Só.
-E eu? Não sou tua inseparável companheira?
-Demais...
-Que farias sem mim?
-Nunca pensei nisso.Reconheço-me como ousadia.Sou indispensável.Sem mim,nada serias...
-Seria ,sim!Sou princípio...~
A coragem chegou.Espreitou.Escutou.Por uns momentos.Tinha uma forma indefinida.Parecia um facho de luz saído de uma mão.Interrompeu a conversa que tinha estado a ouvir encostada ao mastro maior.
-Pareço parecida contigo,ousadia!Não o sou.Estou revestida de bom senso
-Bom senso?!Isso seria a minha própria negação!
-Pensas que sim?Pois a História identifica-me e elogia-me.Sou a antítese da cobardia.Conduzo a sociedade.
-Não te aproximes!Não sou temerária!...
-Não me aproximo porque não te quero destruir .A minha força esmagar-te-ia...
E apagou-se.
Uma nuvem imensa cobriu o céu.Baixou sobre a forma de um suave nevoeiro.Sentou-se no chão.Parecia leve.
-Eu sou o amor!Maior que vocês!Enganam-se quando me chamam de ousadia,aventura ,coragem...Na verdade sou eu que vos faço ser.Quando querem a alguém ou alguma coisa lutam...porque a desejam...entregam-se...Sou eu,apenas eu...
A solidão estava escondida num buraco escuro.Apareceu de negro vestida.Ao ouvir as palavras do amor afirmou em tom melancólico mas firme:
-Bem te conheço ,amor.Se és causa eu sou efeito.Sem ti eu não seria tão forte,tão magoada.Quando não estás eu irrompo.Com tal violência que do pano forte das velas que nos guiam faço os farrapos que aqui estão!...
O amor indignou-se.
-Não sou razão de dor mas de paz!...
-Enquanto estás és ternura.Quando foges,destruição.
-Segurem-me!Valorizem-me!
-Nem sempre o mundo nos deixa.O egoísmo aparece em forma de estrela.A desordem em forma de lei.A corrupção em forma de poder...
-Co-existo com tudo isso.Por que me querem esquecer?!aqui eu sou lembrança,sou passado.
-Aqui tens outro nome:és a saudade!
-Que só existe para os portugueses.Talvez fosse mais uma descoberta da Expansão...
-Onde nasceste,não sei.Reconheço-te no tempo.Eu e saudade somos a tristeza.
-Estás confundida,solidão.Não posso ser saudade porque vivo.
-A saudade é uma forma de amor.Não descrimina.Aparece de mansinho e é indestronável.Tem um perfume próprio.
Com estas palavras o amor ficou a pairar no ar pensativo.
Uma guitarra deu os primeiros acordes.Talvez chorasse baixinho.Talvez fosse a voz das lágrimas dos marinheiros.Dos amantes.O som ia aumentando mais...um pouco mais...mais...O navio continuava a navegar.Os sentimentos juntaram-se num poema.Ali,cantou-se o fado.
E foi levado ao Mundo.
-